quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

O DIÁLOGO MAIS URGENTE


Comissão Nacional Justiça e Paz

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O DIÁLOGO MAIS URGENTE

COMUNICADO DA COMISSÃO NACIONAL JUSTIÇA E PAZ A PROPÓSITO DO RECENTES ATAQUES TERRORISTAS DE PARIS E DA NIGÉRIA

1. Os recentes ataques terroristas de Paris e da Nigéria, com repercussões que se estendem até hoje, suscitam em muitos dúvidas sobre a viabilidade da convivência pacífica e harmoniosa entre pessoas de diferentes culturas e religiões nas sociedades europeias. Em especial, a presença de pessoas de fé islâmica é vista por muitos como uma ameaça. Há quem evoque a este respeito a conhecida (mas não comprovada) tese do choque de civilizações.

Num mundo globalizado e na era das comunicações sem barreiras, é, porém, por um lado, ilusório e, por outro lado, empobrecedor pensar em sociedades culturalmente uniformes e isoladas.

A Comissão Nacional Justiça e Paz pretende com esta nota realçar a sua convicção de que, neste contexto, pelo contrário, o diálogo entre diferentes culturas e religiões se torna ainda mais importante, benéfico e urgente. É ele que mais facilita o acolhimento dos muçulmanos nas sociedades europeias (norteado por uma cultura do encontro e da hospitalidade) e é ele, por isso, o mais potente antídoto contra o terrorismo de matriz fundamentalista.

2. A respeito do diálogo inter-religioso, afirma o Papa Francisco na exortação apostólica Evangelli Gaudium (n. 250): «Uma atitude na verdade e no amor deve caracterizar o diálogo com os crentes das religiões não cristãs (…)», é «uma condição necessária para a paz (..)»; com ele «aprendemos a aceitar os outros na sua maneira diferente de ser, de pensar e de se exprimir». E no recente discurso aos participantes num encontro promovido pelo Pontifício Instituto de Estudos Árabes e Islâmicos: «…o antídoto mais eficaz contra qualquer forma de violência é a educação à descoberta e à aceitação da diferença como riqueza e fecundidade.»

3. Não podem confundir-se expressões marginais de fanatismo extremista, que instrumentaliza a religião islâmica em função de um projeto ideológico e político, com o sentir da maioria dos muçulmanos, nestes incluindo os que vivem em Portugal e os seus representantes. A estes também repugna o terrorismo, e, mais ainda, repugna a instrumentalização da sua fé para o justificar. Com estes podem os cristãos encontrar riquezas comuns (em torno dos princípios do amor a Deus e ao próximo) e criar laços de fraternidade.

A eles se refere a declaração Nostra Aetate (n. 5), do Concílio Vaticano II: «A Igreja olha (…) com estima para os Muçulmanos, que adoram o Deus único, vivo e subsistente, misericordioso e omnipotente (…)»; «Embora ao longo dos séculos não poucas discórdias e inimizades tenham surgido entre Cristãos e Muçulmanos, o sagrado Concílio exorta todos para que, esquecendo o passado, pratiquem sinceramente a mútua compreensão, defendam e promovam, em comum, a justiça social, os bens morais, a paz e a liberdade para todos os homens.»

O conflito de civilizações do passado não tem, pois, que reproduzir-se no futuro.

4. Para evitar o choque de culturas, a solução não reside em eliminar do espaço público todas as manifestações religiosas, relegando-as para a esfera estritamente privada. Nas religiões encontram muitas pessoas um sentido para as suas vidas, a força para enfrentar as dificuldades, o cimento da harmonia familiar e comunitária. Não pode pretender-se que os muçulmanos e outros crentes deixem de o ser, reneguem a sua fé, para poderem ser acolhidos nas sociedades europeias. Essa pretensão acabaria por favorecer o extremismo fundamentalista, que rejeita esse acolhimento. No seu discurso ao Parlamento Europeu, o Papa Francisco associou esse extremismo ao «grande vazio de ideais a que assistimos no chamado Ocidente» e citou uma afirmação do seu antecessor Bento XVI: «o que gera a violência não é a glorificação de Deus, mas o seu esquecimento». 5. A liberdade de expressão é um valor precioso das sociedades livres e democráticas. Mas tem limites, porque, como afirmou Bento XVI na sua viagem ao Líbano, «a liberdade humana é sempre uma liberdade compartilhada, que pode crescer apenas na partilha, na solidariedade, no viver juntos, com determinadas regras.»

Comissão Nacional Justiça e Paz

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