quarta-feira, 4 de março de 2015

Cuidar o Idoso


                       Cuidar o Idoso

 Hoje, numa visita a um idoso, acabei de ouvir a empregada doméstica que desde o princípio mostrou ser pessoa carinhosa, afectuosa e substituta de uma filha muito querida, não daqueles que vemos descartar os seus progenitores que já são velhos, os velhos, a velha, referindo-se a uma mãe, e a viver uma vida sem interesse em ter filhos porque dão que fazer, dão trabalho e consumições.

Esta empregada usou na conversa a palavra “cuidar” os idosos, cuidar daquele e outros com quem mantém e manteve sempre a mesma postura. Ela não trabalhava para ele, mas cuidava dele como os seus filhos quando eram bebés ou crianças.

É preciso ter muita paciência e não esquecermos que não é com arrogância, ou impulsivamente, que se trata de um bebé, como acontece a um idoso. Se somos impulsivos ou se se age com gestos de pouca delicadeza como quem está a fazer um frete, o idoso sente isso e fica mais nervoso. É preciso tê-lo calmo e dar-lhe tudo o que precisa para se sentir bem. Para mal estão as suas limitações. Gostei. Os filhos deste idoso podem estar felizes porque têm uma empregada que os substitui bem.

Ora quando cheguei a casa leio um artigo reenviado por um amigo cujo tema era o seguinte “Solidão e Ética do Cuidado” de Anselmo Borges. Li-o com sofreguidão porque me veio lembrar a visita e a conversa que tinha feito umas horas antes.

Estamos de facto num mundo a que o materialismo e consumismo nos levaram à época do descartável.

Descartáveis são os objectos desde os mais pequenos aos maiores, desde uma simples colher a um carro ou uma casa; mas pior ainda é que até as pessoas são descartáveis, isto é, o resultado líquido da sociedade de consumo.
 


Segundo Anselmo Borges isto é paradoxal: “A felicidade está em ser-se permanentemente infeliz, porque o consumo aumenta cada vez mais a insatisfação e a felicidade da insatisfação é uma felicidade paradoxal.”.

Consome-se apenas e não se reflecte. O Homem não reflecte e faz os disparates que entende mesmo contra a natureza, contra a vida e o respeito pelo outro.

O ser humano precisa de alguma solidão para pensar, sentir e encontrar-se consigo mesmo. Isto é comum a qualquer ser humano. A pessoa humana não é um espírito desencarnado e precisa de não se perder na ruptura com o passado para envelhecer mais depressa e se sentir inútil, peça que alguém quer descartar, ou espera desfazer-se dela.


Muito gostei da conversa da tarde com a Senhora Dona (…) que já me esqueci o nome.

Aqui está a ética do cuidador que é aquele que, sempre presente, na solidão, pois cuidar é estar presente para todos: para o padre, para o médico, para os pais, para os filhos, para os netos. O Cuidador é o passado no presente a preparar o futuro.

“Porque é que nos sentimos sós?” Diz o autor desse artigo que li: ”Saber-se e sentir-se desabrigado, sem tecto, sem morada.” Por isso, “ajudar a vencer a solidão é oferecer a alguém uma morada, uma hospedagem, o cuidado de um abrigo; o abrigo do nosso olhar, o abrigo do nosso ouvido, da nossa palavra, da nossa mão, dos nossos gestos, da nossa compreensão e confiança, da nossa estima, chamar-se amizade ou mesmo amor.”


É, portanto, cuidar, usar voz baixa, mas sobretudo clara e sonante, mão leve e carinhosa, ouvido atento mesmo no silêncio, olhar terno e suave, gesto afectuoso e cheio de doçura, arrancando do outro estima e confiança.

Assim o Idoso é memória, é história, é sabedoria que merece respeito e veneração. Nada para lançar aos caixotes do lixo, mas reconhecer os afectos e carinhos que a família, ou na vez da família, alguém lhes dá.

Assim, vale a pena dizer que damos Alma à Vida.

 
 
 
 


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