10 razões para
ter filhos
“Há um lado olímpico em ter
muitos filhos. Eles testam os nossos limites e são um desafio permanente”
Há dias, uma leitora, farta de me
ouvir resmungar, fez-me esta pergunta: se eu me queixo tanto dos miúdos, se
eles me dão cabo da cabeça e me tiram tanto tempo, por que raio decidi eu
tê-los, e ainda por cima logo quatro? E de repente, percebi que nunca respondi
cabalmente a esta importantíssima questão. Porquê?, de facto. Vai daí, decidi
alinhavar 10 razões para ter filhos, como penitência por estar sempre a dar
razões para não os ter.
1.
A
razão ontológica. Ser ou não ser não é para mim uma questão. Sófocles escreveu
que o mais feliz dos seres era aquele que nunca tinha nascido. Faulkner escreveu
que entre a dor e o nada, escolhia a dor. Eu voto em Faulkner. Mil vezes ser do
que não ser. E nascer é fazer ser.
2.
A
razão estoica Há um lado olímpico em ter muitos filhos. Eles testam os nossos
limites e são um desafio permanente às nossas capacidades físicas e mentais.
Não sou capaz de saltar à vara nem de correr a maratona. Mas criar quatro putos
dá uma abada a tudo isso.
3.
A
razão ulrichiana. Numa civilização acolchoada, sem guerras nem catástrofes, o
pessoal tende a amolecer e a confundir chatices com tragédias. Ter muitos
filhos sintoniza-nos com a máxima do banqueiro Fernando Ulrich: “Ai aguenta,
aguenta.” Que remédio.
4.
A
razão romântica. Quando se ama alguém, os desejos do outro contam. Se a
felicidade da minha mulher passa por ter uma família grande e se a minha
felicidade passa pela felicidade da minha mulher, então a minha felicidade
passa por ter uma família grande. Chama-se a isto “propriedade transitiva”. É
muito importante na matemática. E no amor.
5.
A
razão revolucionária. Citando o sábio Tiago Cavaco na luminosa canção “Faz Filhos”:
nos nossos dias “constituir família é a suprema rebeldia”. Ambos partilhamos a
fé neste verso: “Conquistas fabulosas através das famílias numerosas.”
6.
A
razão coppoliana. Está escrito em ‘Lost in Translation’, de Sofia Coppola: “O
dia mais assustador da nossa vida é o dia em que o primeiro nasce. A tua vida,
tal como a conheces, acabou. Para nunca mais voltar. Mas eles aprendem a falar
e aprendem a andar, e tu queres estar com eles. E eles acabam por se tornar as
pessoas mais adoráveis que irás conhecer em toda a tua vida.”
7,
8, 9 e 10. As mais importantes razões de todas. Carolina, Tomás,
Rui e Rita. Se calhar, eu até passava bem sem filhos. Mas não sem eles.
João Miguel Tavares, jmtavares@cmjornal.pt, In Correio da manhã,
24 Fevereiro 2013
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