sexta-feira, 9 de agosto de 2013

A erva mate foi fundamental na primeira evangelização na América Latina, foi um instrumento de desenvolvimento nas missões jesuítas no sul do continente



A erva mate foi fundamental na primeira evangelização na América Latina, foi um instrumento de desenvolvimento nas missões jesuítas no sul do continente

05.08.2013     Alvaro Real                
 
 
 

© AFP PHOTO / Javier Raul Dresco
 
 
 
 

O Papa Francisco gosta muito de chá mate. No mate se unem duas peculiaridades: sua nacionalidade argentina, onde é “bebida nacional”, e sua pertença à Companhia de Jesus, a grande precursora do cultivo, da industrialização e da distribuição da erva, considerada “ouro verde”, ou chamada ainda de “chá dos jesuítas”.
 
A utilização da folha de mate para a preparação de bebidas estimulantes e com finalidade medicinal provém das tradições do povo guarani. Foram os jesuítas os primeiros a promover o uso do mate por sua atividade estimulante, o que permitiu aumentar o potencial de trabalho nas missões indígenas e diminuir o consumo de álcool.
 
Houve um tempo em que o mate foi proibido. No dia 20 de maio de 1616, o governador de Buenos Aires Hernando Arias de Saavedra, mais conhecido como Hernandarias, publicou um decreto em que proibia qualquer uso do mate. Ele o denominava como uma erva “do demônio”, “vício abominável e sujo”. Os próprios jesuítas chegaram a ver o mate com maus olhos, mas depois aceitaram controlar o seu cultivo, sobretudo para ajudar os camponeses que o cultivavam.
 
No início da colonização europeia da América Latina, a planta só era obtida na serra de Mbaracayú, no Guayrá, 500 quilômetros ao norte de Assunção. O acesso até esse lugar era difícil, e muitos dos que iam para alcançar os seus benefícios acabavam pagando o preço do clima insalubre.
 
Os jesuítas humanizam o cultivo
 
Os índios a serviço dos espanhóis morriam em massa durante os meses de colheita do mate. As selvas tropicais, a falta de refúgio, a pouca quantidade de alimento, tudo isso proporcionava epidemias e mortes por exaustão. Seriam os jesuítas os encarregados de humanizar, aperfeiçoar e racionalizar a colheita do mate selvagem. Eles atuaram nesse ramo até o ponto da erva ter ficado conhecida como “chá dos jesuítas”.
 
O mate seria então um grande recurso para auxiliar no pagamento de tributos ao reino espanhol. Os padres jesuítas conseguiram encontrar um sistema de fecundação e de cultivo que proporcionava alta produtividade. Assim os jesuítas conseguiram transformar os guaranis em cidadãos do reino.
 
O mate como forma de solidariedade
 
Tudo isso, unido à absorção de elementos religiosos guaranis para a evangelização, permitiu a pregação jesuítica naqueles lares. Em vez de substituir a tradição guarani de casas abertas e propriedade comum, eles conseguiram fortalecer as formas associativas de produção dentro da comunidade e compartilhar com outras comunidades.
 
A solidariedade também foi uma característica. Conscientes da importância do mate, as missões os trocavam por carne ou até artesanato de regiões com menor capacidade produtiva. Produtos agrícolas também eram trocados pelo “ouro verde”.
 
Hábito inalterado
 
Poucas coisas mudaram no hábito de beber mate popularizado pelas missões jesuíticas. Seu consumo enraizou na Argentina, no sul do Brasil, no Paraguai e no Uruguai. O mate, a cuia e a bombilha continuam sendo os mesmos há 200 anos. Só a utilização de garrafas térmicas para manter a água quente foi o que mudou.
 
O ingrediente dos guaranis, especialmente bem cuidado e desenvolvido pelos jesuítas, tornou-se o “chimarrão” no Brasil e simplesmente “mate” na Argentina, Uruguai e Paraguai.
 
Em alguns momentos em que circulava entre os jovens no Rio de Janeiro, o Papa Francisco foi flagrado aceitando um gole de mate de um ou outro peregrino que lhe oferecia. Como um bom jesuíta argentino, o Papa não rejeita um chimarrão.

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