Não há memória da
origem das festas populares do S. João, do bairro da Bandeira, assim como os
festejos de S. Pedro, na Ribeira, mas o mesmo não acontece a propósito das
marchas que apareceram por ocasião do cinquentenário do S. C. Vianense e
tiveram duração efêmera.
Aconteceu na década de 40, mais precisamente no
ano de 1949.E não podia deixar de ser uma ideia de Amadeu Costa, pois tendo o
S. C. Vianense à sua disposição o Mercado para os bailes das festas populares,
este ilustre vianense, grande animador e promotor da cultura, lançou o projecto
dum festival de marchas,
Também se
usa a fisga, de sol a sol; é livre no turno, mas proibida de noite.
Muito é
preciso trabalhar para fazer face às despesas, o barco custa 80.000$00, motor,
sendo razoável, 90.000$00, e cada rede cerca de 15.000$00; por isso, o íixe
também não pode ser barato e, muitos dias são perdidos, devido ao tempo, ie não
permite a faina.
A arte é
dura, não rende todos os dias e daí procurar-se outro ofício, em terra, ira
melhor rendimento. Assim se vai acabando a tradição dos pescadores, no rio,
Bairro da
Bandeira. Dos três turnos assinalados, só 15 homens, ao todo, vivem; clusivamente da pesca.
Naquele grandioso recinto,
ornamentado de ferro fundido, que só é lamentável ter sido destruído. Esse
pormenor não interessa para aqui. A ideia de Amadeu Costa vingou, coadjuvado
pelo Dr. Eduardo Correia Guedes e pelo José Esteves Alves.
Foi assim
que apareceram as marchas dos bairros principais da cidade, da Ribeira, da
Bandeira e do Bairro Jardim, no intuito de angariar fundos para a magra bolsa
do Vianense.
As marchas
eram cuidadosamente ensaiadas, desde a música à letra, desde o desfile ao
ritmo, desde as cores às luzes.
Dos
bairros saiam as marchas em direcção ao Mercado e a população da cidade apinhava-se
nas ruas a ver e a aplaudir. Era novidade, era vida, era festa; e as agruras da
vida pareciam ilusoriamente esquecidas no meio de tanta luz e cor, de tanta
animação que reinava no Mercado a «arrebentar pelas costuras».
A
Bandeira, tão bairrista, não ficava indiferente e tinha de participar em pleno.
Para isso, havia muitos animadores, entre eles contava-se a colaboração de José
Araújo, Manuel Fartura, Hilário, Fresquinha, Baratinha, Alberto Silva, Mário
Bezerra e Luís Trinta.
A primeira
marcha (em 1949), foi ensaiada no Liceu Gonçalo Velho; a segunda (em 1951), na
Escola do Carmo, a terceira realizou-se em 1952 e ensaiada num armazém que hoje
é propriedade do Cura.
A
letra da primeira marcha foi da autoria de Manuel Fartura e José Araújo; no
entanto, no primeiro ensaio ela não foi considerada a melhor letra e Castelão
de Almeida, com o Reitor do Liceu, prepararam outra.
Passamos
a transcrever as duas:
É um facto,
E uma certeza
Que Viana
vai melhorar,
Quando a
Bandeira
não tiver mais
buracos para tapar.
Sempre
gostei de morar
No
bairro aonde a tradição
Manda a todos folgar
Na
noite de S. João.
Aí vem
a Bandeira
Lindo
bairro de tricanas
Com fama muito altaneira
Que dá brilho a Viana.
Tem nas
suas lides
Do que
a fama o rodeia
Os
grandes Castros e Silvas
E os
pescadores da lampreia.
SEGUNDA LETRA
CORO:
Cantai,
raparigas,
Com
amor e alma,
As
nossas cantigas
Ninguém
leva a palma.
I
Em
Viana de mil encantos,
Maravilhas de luz e cor,
A Bandeira é entre tantos
Bairros tão belos, é o melhor.
I I
Não há
moça sem um amor,
Nem
janela sem namorado,
Quando a luz surge em esplendor
Neste bairro tão afamado.
III
Ai
Bandeirinha, és minha amada,
És um
lar querido onde eu nasci,
Tens
um bom vinho e a estudantada,
Que
triste sou longe de ti.
O júri
na primeira apresentação, foi constituído pela Direcção do Vianense, íuel Couto
Viana, Castelão de Almeida e o comandante da Capitania de Viana, prêmios
atribuídos foram de 500$00, 300$00 e 100$00, respectivamente, para |2, 2a e
32 prêmios.
g0
segundo ano do festival, a letra da Marcha da Bandeira foi da autoria de ído
Reguengo e a música de José Pedro. Há uma outra versão sobre o autor etra que
diz ter sido Rui Feijó. Neste segundo festival, participou também o ro Jardim.
Os Bairros da Bandeira e do Jardim uniram-se, em simpatia, contra airro da
Ribeira.
Enquanto
no primeiro ano o primeiro prêmio coube ao Bairro da Ribeira, o undo ao Bairro
da Bandeira e o terceiro a Darque, no segundo ano os prêmios m atribuídos por
valores apresentados: exibição, marcação, traje, balões, etc., e m foi criada
uma certa confusão, como pensaram os da Bandeira, que ficaram lilhados pelo
segundo lugar, atribuído no primeiro festival. «Foram mais os nios, mas apenas
para nos deitar terra nos olhos».
\ atribuição do
segundo prêmio tinha agudizado as rivalidades entre a Ribeira e andeira,
acusando o júri de compadrio e de ter sido levado pelas lagostas que ja Ribeira
traziam na marcha, enquanto as da Bandeira levavam peixe mais re, peixe do rio.
Claro que não seria bem assim, mas os da Bandeira não se formaram e apareceram
letras que bem mostraram a agressão dos rivais:
Bairro da Bandeira esfomeado, Vamos, raparigas,
Cheiinho de graça, Vamos
ao Mercado,
Começa em S. Vicente, Buscar
o segundo
Foi fazer sujeira na Praça. Que o primeiro foi roubado.
O Bairro
da Bandeira
Que
andava a cair Cheiinhos de fome
Foram
para a Praça pedir.
Cantai, raparigas,
Vamos ao Mercado,
Buscar o dinheiro
Que nos foi roubado.
Derto é
que os da Ribeira fizeram uma apresentação mais fidalga, enquanto a ideia se
evidenciava, sobretudo, pelas tricanas que pisavam melhor, isto é, am outro
tique no bater da chinelinha, que era de verniz. Aliás, já tinham essa a de
tradição.
0 prêmio
dos 300$00, recebido pelos da Bandeira, foi, depois, gasto num convívio realizado
no Asilo das meninas Órfãs, tendo sido partilhado ainda com as meninas pobres do
referido Asilo.
D Zé
Araújo era deficiente motor, mas era um gênio na confecção de trabalhos papel.
No
entanto, a animosidade foi, sobretudo, a nível das mulheres, pois os homens
pescadores do rio - os da Bandeira e pescadores do mar - os da Ribeira), continuaram
a manter relações de boa camaradagem.
Eis a
letra do segundo festival, cujo autor teria sido Alfredo Reguengo e o autor
música Zé Pedro:
MARCHA DA BANDEIRA
CORO:
Bairro sorridente, Cheiinho de graça, Nasce em S. Vicente, Termina na
Praça. Bairro da Bandeira, Que passa a sorrir Carícia fagueira De cravos a
abrir...
VOZ
Passam capas de
estudantes Como andorinhas na rua; Cruzam-se olhares cintilantes, Há sorrisos,
há descantes Onde a alegria flutua...
O velho Liceu
fechou-se,
Mas inda hoje está
cheio De saudade, funda e - Tão viva como se fosse Um fogo, a arder-nos no
seio.
CORO:
Bairro
sorridente, etc.
Raparigas da
Bandeira,
Tricaninhas de postal.
Lindas mãos de costureira
Que a agulha pica
matreira,
Sem respeitar o dedal..
.
Trabalho p’ra cada
dia
Nosso Bairro tem
em si;
Na grande
Camisaria
E a fabricar com
mestria
As boinas de CEDEMI...
CORO:
Bairro sorridente,
etc. VOZ
Pescadores do nosso Rio,
Vinde vê-los ao Sol pôr.
Caem os sáveis a fio
E a lampreia, ao desafio,
Vem emalhar-se de
amor...
CORO:
Bairro sorridente,
etc.
VOZ
Oh Bairro dos
Fogueteiros
Que enchem as noites de cor.
Logo aos primeiros morteiros
Os anjos
correm ligeiros
A espreitar o seu fulgor...
CORO:
Bairro sorridente, etc.
Na sua rede
singela
Não há peixe que não caia...
Cachopas, tende cautela!
cuidado ao passar
por ela,
Não vá prender-vos pela saia...
E à Lua, a rir de contente,
Piscam d’olho os outros
astros
Como a dizer: - Não há gente
No mundo mais competente
do que estes
Silvas e Castros..
LETRA DO TERCEIRO FESTIVAL
CORO
Bairro onde o
trabalho mora
A chinelinha ainda canta
Bandeira que o sol namora
Bandeira
bendita e santa.
II
Bandeira, caminho em recta,
Como é recta a nossa vida;
Bandeira, tu és a meta,
Não és ponto de partida
As Azenhas do Dom Prior,
Leira
Longa às Carmelitas;
Pétalas da mesma flor,
A flor que é mais bonita
O nosso bairro, em verdade,
Ninguém leva à dianteira;
Clarins, tocai a sentido
Que vai passar a Bandeira.
Junto a nós o rio passa
A sorrir sonhos de prata
Ansioso por ver a graça
Nos fogos da serenata.
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