segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

A Paróquia na sua dimensão social


A Paróquia na sua dimensão social

 



1.    A Igreja e os sinais de Caridade

Dou-vos um mandamento novo: que vos amais uns aos outros; que vos ameis uns aos outros assim como que vos amei. Por isto é que todos conhecerão que sois       meus discípulos: se vos amardes uns aos outros. (João 14, ou 16...)

Quando esta Boa Nova, atinge os corações, é aceite, isto é, há adesão e compromisso, forçosamente modela o agir humano ao jeito da pessoa de Jesus Cristo.

            Os sinais de Caridade são os únicos e inequívocos sinais de visibilidade da acção pastoral da Igreja por vontade de Jesus Cristo. Como pessoa divina, assim reconhecido pelos Magos no Presépio, proclamado no seu baptismo e reconhecido como tal  nos diversos milagres que acompanharam a sua acção e, como pessoa humana que concomitantemente reunia na sua essência, sempre se manifestou sensível, muito humano, a participar das alegrias e das tristezas dos seus comtemporâneos, nas Bodas de Caná ou na morte de Lázaro e, quer num quer noutro acontecimento, surgem dificuldades. Apesar de Fez o milagre da transformação da água em vinho para que os noivos não ficassem mais preocupados e menos alegres ao verem os seus convivas bem. Restituiu a alegria às irmãs e aos amigos de Lázaro, ao dar de novo a vida a um corpo morto e já fétido...

            Os Apóstolos entenderam bem esta mensagem pelo que, desde a primeira hora, após a Ressurreição de Jesus e a sua subida ao Céu, logo realizaram comunhão de vida e se dedicaram ao serviço fraterno.

            Fomentaram entre os primeiros cristãos verdadeiras e autênticas comunidades que interpelavam os estranhos, sobretudo pela comunhão de vida a partir dos bens. Por isso, os estranhos exclamavam “Vêde como eles se amam”. Formando-se assim em comunidades verdadeiramente modelares porque não eram obras do poder dos homens, mas obras do Espírito.

            Criaram tradição. Este é o património deixado pela tradição apostólica. Ainda hoje é regra de ouro na actualização permanentemente das orientações pastorais e na vivência cristã da Igreja.

            Depois dos Apóstolos somos nós, a igreja de hoje que tem de continuar esta tradição, esta comunhão de vida e este serviço fraterno. É por isso que dizemos que a nossa missão, a partir do baptismo, é uma missão tríplice porque é participação da mesma missão de Jesus Cristo, como sacerdote, profeta e rei, ou seja, há que conhecer estudando e partilhando saberes, há que celebrar pontualmente as alegrias do Mistério que se nos é revelado e há que servir, na vivência com os outros, as exigências dos mesmos mistérios para que este serviço seja luz do mundo, isto é, se transforme em luz que se coloca sobre o alqueire, em sal da terra para que esta deixe de ser insípida, em fermento na massa para que a levede, em semente que morrendo na terra possa dar fruto.

            Isto é visibilidade. É testemunho.

 

 

2.    A Lei do Amor e o distintivo das nossas obras

Ninguém gosta de descansar enquanto não forem irradicados  problemas como os da fome e da miséria. É a fome e a miséria (esta miséria vai desde a fome, privação de bens essenciais à sobrevivência do ser humano até aos sem abrigo, marginalidade, seja ela qual for),  para que a salvação se dê na globalidade do corpo e da alma: o ser físico, mental e espiritual. Constitui sempre um bloqueio.

            Isto não é outra coisa senão o AMOR que atinge o coração de qualquer homem da sociedade contemporânea. Arde por dentro e nos projecta para a transformação total em Jesus Cristo. “Amai-vos uns aos outros”...

Segundo Santo Agostinho: “O Amor a Deus é o primeiro na ordem do preceito, mas o amor ao irmão é o primeiro na ordem da acção...” “ Ama o próximo e examina, esse amor pelo outro. Naturalmente encontrarás a causa de Deus. Então reparte o teu pão com o faminto, abre a tua casa ao que não tem abrigo, veste o nu e não desprezes a nenhum dos que são da tua raça humana.”

            Só o Amor é capaz de gerar solidariedade e fraternidade e de nos conduzir a vencer em comunidade a fome e a miséria para que a salvação se dê na globalidade do corpo e da alma: o ser físico, mental e espiritual.

            A nossa missão é por isso Caridade, Amor e Acção. Amor sem Caridade não é Amor. Serviço fraterno sem Amor não é Caridade. Aqui está o segredo da nossa competência, imprimir uma certa disciplina social à nossa vida, fundada sobre os valores humanos de justiça, responsabilidade e solidariedade. Esta Caridade comprometida é símbolo dum Amor soberano, pessoal e colectivo, foco irradiante da essência cristã.

            “É escandaloso a pretensão de exercer a caridade sem promover a justiça e a luta por ela,” dizem os nossos Bispos na Instrução Pastoral sobre a Acção Social da Igreja. Jesus continua hoje a dizer quando nos lamentamos da miséria, do sofrimento, dos marginais, dos drogados, dos toxicodependentes, dos alcoólicos, da presença dos imigrantes de Leste: “Dai-lhes vós mesmo de comer!” (Mt.14,16).

            Pregar e Baptizar já não é missão única para a Igreja. Esse tempo já passou.  A “Rerum Novarum”, de Leão XIII, em 1891, é um exemplo de que não basta matar a fome é preciso humanizar as estruturas e fazer o mundo mais humano, como concluia PauloVI. Doutrina que todos os Papas têm proclamado nas diversas encíclicas sociais até aos nossos dias. O culto não pode estar antes da justiça e da solidariedade para com os que sofrem. “Eu detesto as vossas festas...e não gosto dos vossos cultos...(cf. Amós 5) “ O jejum que eu aprecio é este: abrir as prisões injustas, desatar os nós do jugo, deixar ir  livres os oprimidos, quebrar toda a espécie de jugo...” Só quando isto acontecer, a tua luz surgirá como a aurora e as tuas feridas cicatrizarão. (cf. Isaías 58)”A nossa missão vai mais longe...

 

3. A Paróquia célula visível da comunidade.

                        A Paróquia é um espaço de comunhão bem curto, bem pequeno. A comunhão começa na família, estende-se ao conjunto de famílias, à Paróquia,  às Paróquias, isto é, à Diocese, que coordena a Comunhão máxima da Igreja local, em relação à Igreja Universal.

Por isso, na Paróquia, o espaço próprio para o encontro da identidade cultural e social dum grupo de famílias que se conhecem mutuamente e pelo nome, onde a Comunhão é mais viável e evidente, encontramos o espaço onde a visibilidade da Igreja se torna sacramento mais fácil e eficaz.

            Para a concretização ordenada desta missão eclesial, existe um Conselho Paroquial de Pastoral, o meio pelo qual a Igreja exerce parte da sua missão para com os homens. O exercício da Caridade é exercido de modo mais eficaz, permanente e espontâneo, mas obrigatório.

É na Paróquia que mais facilmente nos envolvemos de uma forma integral na vida íntima duma comunidade, isto é, na comunhão com os outros enraizada na fé de Jesus Cristo, ressuscitado, que está sempre vivo, presente e actuante no meio da mesma. É na Comunidade onde nos  identificamos com mais facilidade e podemos também, com facilidade, exercer a Caridade de Jesus Cristo, que ilumina a solidariedade humana nos deveres para com as pessoas singulares ou colectivas. Dissolvendo protagonismos, brilhará mais longe a Grande Luz, a  primeira que inspirou a Comunidade  a reunir a generosidade individual para dar corpo à acção do espírito.

            Esta Luz faz com que as nossas obras tornem a Igreja visível porque fará das nossas obras ofertas preciosas de Amor e nisto serão obras diferentes das do Estado. É na visibilidade do Espírito que os outros encontrarão a diferença e nos apontarão... “Vêde como eles se amam!!.

            Esta competência e missão da Igreja numa sociedade altamente competitiva, de violência e de luta de classes, há-de manifestar-se através dos leigos como bons profissionais, bons políticos, bons companheiros de trabalho e bons membros de família. Nesta competência estão as denúncias públicas de injustiças sociais, as respostas às situações mais diversas de pobreza, tendo em conta que o conceito de pobreza da Igreja é diferente do conceito de pobreza dum político. Uma vez que, segundo a lógica Cristã, o rico pode ser pobre e o pobre pode ser rico.

            A nossa própria linguagem tem de ser sinal de caridade e criar novidades para que as nossas obras ultrapassem o domínio das de origem política ou de puro altruísmo.

            O que estamos a fazer, na Comunidade a cada hora e a cada momento, é procurar que, aprendamos a dar um sentido novo à vida. A vida no Amor...

A opção de Jesus Cristo foi sempre muito clara, logo no nascimento  se voltou para  gente simples e abandonada e durante a vida sempre optou pelos pobres a quem muitas vezes matou a fome. (Mt. 14, 13-21).

            Não vemos Cristo a ocupar outro lugar.

Está sempre ao lado dos pobres e dos que precisam, dos aleijados, dos estropiados, dos doentes, dos pecadores e dos pecadores públicos... dos que passam fome e sede...

Por isso a nossa  atitude também não pode ser outra na  vida pastoral. Não devemos estar tão preocupados com o aparato e as grandes obras porque, quando Jesus nos diz que “Vejam as vossas obras e louvem o vosso Pai do Céu” (Mt. 5,6), é para que sejamos grandes realizadores com meios simples e humildes porque só na humildade e na simplicidade é capaz de se descobrir sinais de Deus.

Tanto hoje, como ontem, numa região com o menor poder de compra do país, onde  encontramos  pessoas que nos batem à porta esfomeadas, também Jesus nos diz, como aos seus discípulos: “Dai-lhes vós mesmo de comer!” (Mt. 14,16).

            Cristo fez uma opção preferencial pelos pobres, foi uma atitude clara e ... sempre se voltou para a gente simples, abandonada, e marginal à qual teve muitas vezes de matar a fome (Mat.14,13-21). Não vemos Cristo a ocupar outro lugar. Está sempre ao lado dos pobres e dos que precisam, dos aleijados, dos estropiados, dos doentes, dos pecadores e dos pecadores públicos, dos que passam fome e sede. Não basta, no entanto, pôr as obras de misericórdia em dia porque muita outra gente é capaz de dar de comer também aos

famintos, mas que as nossas obras sejam distinguidas  pelas razões com que as fazemos.

            A pobreza em si é um mal para o homem. Deus criou o homem para ser feliz e criou os bens da terra para os pôr à disposição dos homens, de todos os homens , segundo a justiça, inseparável da caridade para que por eles fossem administrados, trabalhados e os mesmos dessem frutos (Gen. 1,28...e cf. G. S. 69)

             As promessas de Deus incluem bem-estar material: “A geração dos justos será abençoada, haverá em sua casa abundância e bem-estar” Salmo, 112,3

            O grito dos pobres ultrapassa as nuvens e não descansa enquanto não chegar a Deus. O pobre não se consola enquanto Deus não o atender e o juiz justo lhe fará justiça. (cf. Ecl. 35)

            Deus revela-se como o Deus de todos, pobres e ricos, mas vêmo-lo na pessoa do seu Divino Filho ao lado de quem sofre.

Embora sendo o Pai de todos, Deus ama o rico, mas repudia os seus bens injustos e, no amor ao pobre, pede solidariedade e exige  justiça para com ele.

            Jesus nasceu pobre, é acolhido pelos pastores, gente pobre. Vive uma vida pobre e humilde, em Nazaré. Começa sua vida pública aliando-se nas filas dos que se reconheciam pobres pecadores ao  procurar o perdão pelo baptismo de João. Este procedimento era visto com desdém pelos fariseus, ricos e “justos”.

            Em Nazaré, declara-se cumpridor precisamente da promessa messiânica aos pobres: “ o Espírito do Senhor me ungiu para levar a boa nova aos pobres, para proclamar a libertação aos cativos, dar  vista aos cegos, libertar os oprimidos, anunciar o ano de graça do Senhor. “Lc.4, 16ss.”

            Só o Amor consegue compreender esta dicotomia de pobres e ricos e Deus que não quer a pobreza, sendo criador, é Pai de todos; a todos ama com justiça e com bondade.

            Está longe de viver a fé cristã quem diz que não há pobres. “Na minha paróquia não há pobres”, tantas vezes se ouve dizer. Quem assim  fala não entende nada do que é o sentido da Caridade cristã, da mensagem de Jesus de Nazaré.

É urgente, onde este tipo de comportamentos existe fazer uma revolução. Não uma revolução de armas, mas uma revolução, onde o paradigma seja amor.

            Em primeiro lugar é preciso conhecer a realidade comunitária em relação à vida e à dor dos que sofrem o esquecimento, a solidão, a opressão, as inquietações de injustiça, de fraude, de isolamento que todos os dias envenenam a convivência social, da ignorância, dos que sofrem a marginalização...

            Em segundo lugar Amar, e amar segundo Jesus Cristo é criar atitudes e comportamentos de honradez, austeridade de vida, de solidariedade com todos os pobres que sofrem a miséria e a fome, abrir caminhos e descobrir causas possíveis de solução, criar consciência em toda a comunidade de que a

dimensão sócio- caritativa é fundamental para ela, e a serviço da  Caridade deve implicar uma resposta comunitária visível.

 

5. Na história da Igreja    

            No princípio da Igreja “pôr em comum os bens” era normal. Sobretudo era esse o testemunho que mais cativava... “Olha como eles se amam”. Depois na época patrística aparecem também testemunhos claros de preocupação pelos pobres como por exemplo:

            S. Gregório de Nissa (335-394): “O tempo actual apresenta-nos uma quantidade de nús e de sem abrigo. Há multidões de escravos junto de cada porta. O estrangeiro e o emigrante também não faltam. Por toda a parte mãos estendidas buscando auxílio” (Os padres da Igreja e a questão social, 25).

            S. Gregório de Nazianzo (330-390): “... mas, e aqueles, num sofrimento enorme, enquanto nós bem abrigados em casas luxuosas... e os míseros, tremendo de frio, nos seus farrapos grosseiros... quem não se angustia com estes lamentos? Que olhos são capazes de ver este espectáculo?” (idem, 43).

            S. João Crisóstomo (345-407): “Age com misericórdia e bondade: socorre a penúria, mata a fome, afasta as tribulações. Recomendo que aos necessitados se dê com abundância” (idem, 79).

            Depois na Idade Média começou-se a desenvolver a liturgia e tudo o que envolve esta acção, como seja, a arte, assim como a filosofia, por isso houve na história da Igreja tempos em que a acção sócio-caritativa não era considerada missão da Igreja ou pelo menos era relegada para último lugar. E no mesmo sentido se afirmava que a função essencial da Igreja era ser missionária: Ide e ensinai todos os povos (Mt. 28, 19-20). Pregar e baptizar era a sua particular missão.

Ainda hoje continua a ser objecto de algum tabú, ou de algum medo. Falta muitas vezes a coragem de S.Paulo: Fazer tudo, para a todos levar a Cristo. Isto significa risco, e ser cristão é um risco.

 

6. O Concílio Ecuménico

Ajudou-nos a não esquecer, a partir das missões de Jesus Cristo como Sacerdote, Profeta e Rei, que ser Rei era servir e servir era amar, era dar a vida porque não basta celebrar a fé e proclamá-la, é preciso também vivê-la.

Em Jesus Cristo fomos baptizados nesta tríplice missão e se Cristo era o Caminho, a Verdade e a Vida, temos, como pessoas de fé, comprometidas com a pessoa de Cristo, também nós hoje ser sacerdotes para santificar, profetas para proclamar a verdade e reis para abrirmos caminhos de felicidade aos que de felicidade precisam. Isto diz-se para os ministérios ordenados e não ordenados realçando-se não só a responsabilidade, mas, e sobretudo, a corresponsabilidade.

 

7. A Instituição Particular de Solidariedade Social

Uma IPSS – é uma instituição da iniciativa só leigos ou de leigos comprometidos na Igreja com estatutos próprios e com objectivos definidos e aprovados pelo Bispo da diocese. Mas a IPSS pode ser fundação de um outro movimento eclesial a nível diocesano ou  paroquial desde que aprovado pelo Bispo. Tem de ser autónoma para cumprir 3 objectivos fundamentais na comunidade, como sua mandatária: expressar a generosidade individual, articular a generosidade, equilibrar ou coadjuvar a organização social com os serviços do Estado. Esta autonomia é-lhe concedida pela comunidade, reconhecida pelo Bispo e também, se for o caso, pelo Estado. Não resulta da lei, nem da autoridade estatal, resulta da iniciativa generosa e espontânea da comunidade. Ela é  um meio pelo qual a Igreja exerce parte da sua missão  socio-caritativa para com os homens. É um meio eficaz para o exercício da caridade de modo eficaz, permanente e obrigatório, pois não basta a pregação e a oração, é preciso testemunhar por meio das obras para que sejamos parte da luz que, por excelência, é Jesus.

Uma IPSS deve ser numa diocese ou numa paróquia, um lugar de comunhão fraterna, deve ser espaço onde a comunidade ou as comunidades exercem o Amor e a Solidariedade entre as pessoas.

A grande força moral e a riqueza do serviço aos outros deve resultar do facto da IPSS ser um serviço de leigos da Diocese ou da Paróquia, onde a corresponsabilidade laical pode ser mais notória porque abre portas à integração e participação de pessoas com várias sensibilidades. A IPSS, neste caso, é apenas oportunidade, criada pela comunidade presidida pelo Bispo para servir de suporte a todos os que assumem a estrutura comunitária, institucional para as necessidades encontradas, envolvendo voluntários, na resolução das necessidades da Igreja.

Quem trabalha por esta causa, dá provas de saber o que quer, sabe fazer com fé, justiça e verdade passando teimosamente por cima de muitas contrariedades.

Uma IPSS é espaço de liberdade e globalidade.

Uma IPSS tem uma exigência legal diferente dos outros movimentos e grupos de acção da mesma Igreja, pelo facto de se envolver em acções em que o Estado pode e deve por justiça colaborar com o que hoje fazemos por caridade ou solidariedade. E quando o Estado o fizer por justiça, nós, IPSS, faremos outra coisa...

A Instituição dá a cara em nome da Igreja de um donativo, de uma partilha e até de um serviço. Deste modo garante a liberdade do beneficiário e do beneficiado e ao mesmo tempo pode memorizar a oferta do benfeitor e prolongar a sua memória. Oferecer e garantir a estabilidade e eficácia da acção de quem dá, dá-se sem se comprometer e quer fazer bem sem mostrar o rosto. É uma questão de liberdade! A luz põe-se sobre o alqueire, mas em nome duma Comunidade pode ser mais forte!... Pode iluminar mais... e ir mais longe.

A IPSS tem por isso personalidade jurídica canónica e civil e é responsável administrativamente perante a Igreja e perante o Estado pelo que faz, e como faz.

Sobretudo à Igreja hierárquica tem a obrigação de prestar contas sobre a qualidade dos serviços que presta à Comunidade.

Ao Estado pode interessar o tecnicismo; e à Igreja, mais do que o tecnicismo, interessa a técnica iluminada pelo  amor, o modo como  se faz para que outro não sofra, ou sofra menos. O Amor está sempre, na Igreja, acima da lei e da técnica.

 

8. Necessidade de Informação e Formação

Como obra da Igreja não podemos falar de identidade sem falar de espiritualidade.

Algumas questões poder-se-ão levantar em relação à formação de voluntários para uma colaboração orgânica e articulada de acordo com as capacidades de cada um. Poderá ainda a IPSS numa  Comunidade colaborar com outros serviços e movimentos como a Cáritas, Vicentinos, a Legião de Maria e por aí fora..., para dar uma perspectiva social, que também os deve nortear.

A solidariedade cristã, para cristãos confessos, desnecessário é dizer que tem de ser iluminada pela fé. Não pode ser uma opção puramente humana. Daí a necessidade da Igreja lutar pela formação dos voluntários e trabalhadores assalariados das nossas obras sociais, nas  IPSS.

Há que apostar em equipas profissionais multi-disciplinares e com habilitações próprias, com características humanas e de formação cristã adequadas à missão de qualidade exigida a respostas sociais que damos.

É importante o estudo da acção social e da sua relação com a missão da Igreja, da Comunidade, da vida de fé, esperança e caridade. É importante o estudo dos textos da Doutrina Social da Igreja, da vocação do cristão, da nova evangelização, do compromisso social como exigência da fé dos baptizados.

Os problemas da pobreza, da marginalidade, das diversas carências da fome, da deficiência, da violência, da doença, da velhice, isolados e ainda das crianças abandonadas ou de maus tratos, porque se trata muitas vezes de grupos vulneráveis, entre outros, são objecto da IPSS, porque são objecto do Amor de Deus através da Igreja e a Igreja, somos todos nós.

 

9. Organigrama duma Comunidade Visível

A organização paroquial tem de ser visível como prova do Amor que pulula nos corações dos aderentes, e interpela os alheios e os indiferentes.

Desse modo a Comunidade tem de contar com o padre e com o Bispo e as estruturas que com eles governam ou gerem a coordenação pastoral e que incluem leigos responsáveis, comprometidos que devem ser testemunho de vivência de fé, preocupados com as diversas dimensões da teologia pastoral, isto é, a Catequese, a Liturgia e a Acção Social e Caritativa.

            No sector da catequese dirigida às famílias, idosos, trabalhadores, jovens e crianças tem de haver catequistas e escolas.

            No sector da Liturgia dirigida ou destinada à celebração alegre de todos, conta com leitores, acólitos, cantores, animadores, etc...

            No sector Social e Caritativo destinada a todos e não só aos carentes, aos pobres, mas quem não é pobre aos olhos de Deus? Todos precisamos da Caridade e todos precisamos na Igreja de usar de Caridade. Ela é a alma visível através do nosso comportamento na comunidade e por ela os outros poderão abandonar a indiferença e o seu alheamento para aderirem à fé de Jesus Cristo e integraram-se na Comunidade- igreja visível.

            Tem como as outras dimensões da Igreja de contar com animadores através dos movimentos próprios como os Centros Sociais, os Vicentinos, ou Cáritas, os grupos voltados para os doentes, para a integração social, para a juventude...

            “É grato aos Bispos de Portugal testemunhar aqui o seu apreço pela actividade altamente meritória que tantas Instituições, grupos e Cristãos em geral vêm desenvolvendo em todo o País e nos mais diferentes domínios de acção social.”(cf. I. P. A. Episcopal Portuguesa, 1997).

            Através da  intervenção social da Igreja parece não restar dúvidas,  quanto a sinais vividos nas comunidades paroquiais encontram-se presentes, quando qualquer situação de dificuldade é capaz de fazer levedar a massa da solidariedade,  conduzindo as pessoas a uma maior comunhão de vida e de bens, fazendo festa, celebrando com alegria a palavra, a comunhão da disponibilidade, do serviço porque Deus é, porque Deus Ama, porque Deus é AMOR (S. João) e que serviu de tema à primeira encíclica de Bento XVI.

 

10. A Acção Social Conecta na Paróquia

Foi assim que se pautou a nossa vida de pastoral durante os 28 anos.

Nesta Paróquia de N. Sr.ª de Fátima onde encontramos algo muito diferente do que é agora e, sobretudo de muita pobreza.

Isso esmagava-nos sempre o coração, como hoje. O primeiro movimento que fundamos foi a conferência de S. Vicente de Paulo, em 1978, logo, pouco depois de entrar. Em 1979 fundámos a Legião de Maria e esta com a C. Vicentina fundou o Centro de Convívio de Idosos a funcionar na Sacristia da Igreja em 1980.

Eu não tinha residência. Ao mesmo tempo lutámos com o Conselho Económico pela residência, e por um Centro Social. Só arranjámos terreno para a residência e com um pouco de boa vontade para um salão paroquial para onde passou o Centro de Convívio em 1982. Já era muita gente. Passou a um Centro de Dia e de Convívio. Em 1985 acolhe os AA (Alcoólicos Anónimos)  Chega a necessidade de um Jardim de Infância, em 1986, e abrem-se portas... Vêem os deficientes que ninguém os queria e outras portas se abrem... Em 1980 já funcionava na Sacristia uma Escola de Música que chegou a ter 140 alunos. Surge, em 1987,  por iniciativa da Conferência de S. Vicente de Paulo o Ozanan- Centro de Juventude onde se desenvolveram vários cursos de vários saberes, onde funciona um ATL. Aí já funcionou um Clube Jovens e o JAV (Jovens Amigos da Vida). Vários cursos de pintura, de arraiolos, de crochet, de cerâmica, de Informática e vários projectos com apoios europeus.

Aparece a necessidade de dar a mão aos abandonados (aos bebés e às crianças de alto risco) e surge, em 1992, o CAT- Centro de Acolhimento Temporário, vulgo , Berço de Nª Sr.ª das Necessidades , depois o Cecan-rd, ou seja, Centro Comunitário de Recolha e Distribuição com balcão aberto, desde 1988.

O Refeitório Social foi outra aposta, em 1989, para mendigos, indigentes, passantes, toxicodependentes, e ex- toxicodependentes ou mães solteiras... assim como casa de banho para banho e muda de roupa, uma média de 17/dia , agora.

Aparecem novas necessidades de respostas aos idosos, em 2001, no ADI, Assistência ao Domicílio Integrado (alimentação, higiene e saúde), e o SAD, Serviço de Apoio ao Domicílio (Alimentação e higiene)em todos os dias da semana, em 2002, refeições ao Domicílio, pelo que servimos ao todo 300 refeições diárias entre todas as valências. Por fim o RSI (Rendimento Social de Inserção), em 2005, com três técnicas a funcionar e com alguns bons resultados...

Claro que todo este trabalho se deve às várias direcções de Centro Social, do Ozanan, da Fábrica da Igreja, da Conferência de S. Vicente de Paulo a este Voluntariado superintendato e responsável, mas também a outro Voluntariado que não o descrevo aqui porque os seus nomes vêm em lugar próprio que desinteressadamente e com paixão se entregam de alma e coração aos utentes para que todos se sintam bem e , por fim, aos trabalhadores assalariados em número de 40.

Temos acordos com a Segurança Social, mas não chega para aquilo que precisamos.  

 

 

Conclusão

 

Facilmente aceitamos que a Boa Nova de Jesus Cristo só atinge os corações quando as mentes são esclarecidas e, para que isso aconteça, é preciso vencer primeiro a fome e a miséria para que a salvação se dê na globalidade do corpo e da alma: o ser físico, mental e espiritual.

Hoje, como ontem, numa região das mais pobres do País onde nos encontramos e diante de populações esfomeadas que nos cercam, também Jesus nos diz, como aos seus discípulos: “Dai-lhe vós mesmos de comer!” (Mat. 14,16).

Durante algum tempo se ensinou que a acção caritativa não era missão da Igreja. E, nesse sentido se afirmava que a função essencial da Igreja era ser missionária: “Ide e ensinai todos os povos” (Mat. 28, 19-20). Pregar e baptizar era a sua particular missão.

O Concílio Ecuménico levou-nos a não esquecer as outras dimensões da fé cristã a partir das missões de Jesus Cristo que é Sacerdote, Profeta e Rei.

Em Jesus Cristo fomos baptizados, por isso, participamos neste Jesus Cristo Sacerdote, Profeta e Rei ou seja, neste Cristo, que é Vida, Verdade e Caminho. Como sacerdotes, a igreja, que somos todos nós os baptizados tem de vivificar, santificar ; como Profetas, cabe à Igreja a missão de proclamar a verdade, anunciá-la e, como Caminho, temos que ser luz, exemplo a seguir por todos...

Por isso, um Centro Social é um meio pelo qual a Igreja exerce parte da sua missão para com os homens. O Centro Social é o meio para o exercício da caridade de modo eficaz, permanente e obrigatório, pois faz parte da tríplice missão de Jesus Cristo manifestada nas obras. Não basta oração e  pregação, é preciso o testemunho para que sejamos parte da Luz que, por excelência, é Jesus.

O nome de “Centro” que se deu a esta Obra Social da Paróquia evidencia a função que lhe cabe: uma força unificadora. Se a Paróquia é uma porção do Povo de Deus, uma Comunidade de comunidades, um lugar de comunhão fraterna, o Centro Social ajuda a Comunidade Paroquial a encontrar-se, é o Centro onde exerce o amor e a Solidariedade entre as pessoas.

Mas a grande força moral e a riqueza do serviço aos outros deve resultar do facto de esta Instituição ser um Centro Social Paroquial, portanto, um serviço de Leigos na Paróquia. É através da sua integração e da sua participação na vida da Paróquia - da qual faz parte - que o Centro Social Paroquial atinge toda a sua dimensão na Igreja local que o criou e que lhe dá suporte.

O Centro não pode ser uma estrutura à parte da Paróquia. O Centro é uma resposta Institucional da Paróquia às necessidades encontradas e deve envolver os paroquianos - voluntários - no processo de resolução dessas mesmas necessidades.

Neste campo levantam-se algumas questões quanto à necessidade de informação e de formação de voluntários, para que todos possam colaborar duma forma orgânica e articulada, de acordo com as capacidades de cada um. Simultaneamente, o Centro poderá também colaborar com os outros serviços e movimentos da paróquia, dando-lhes a perspectiva social que também os deve nortear.

É importante que seja clara para todos a ideia que se tem da acção social e da sua relação com a missão da Igreja, da Paróquia e da vida da fé, da esperança e da caridade. É importante encontrar meios de estudar certos textos da Doutrina Social da Igreja, da vocação do cristão, da nova evangelização, do compromisso social como exigência da fé de baptizados.

É importante movimentar o Centro Social Paroquial para que seja cada vez mais parte da Igreja local e Paroquial, e que a Paróquia e Centro vivam em conjunto as respostas a dar à comunidade. Os problemas da pobreza, da marginalidade, das diversas carências, da fome, da deficiência, da doença, da velhice isolada e ainda das crianças abandonadas ou de maus tratos, constituem os grupos sociais com que o Centro Social Paroquial normalmente trabalha.

Estes grupos devem ter simultaneamente na Paróquia um lugar predilecto e ser uma preocupação constante, exactamente porque são os mais vulneráveis de entre todos os paroquianos.

Além dos meios materiais e humanos, a Paróquia tem ainda de dar prioridade à oração por todos aqueles que trabalham nos seus Centros, para que o que fazem, façam de uma forma cada vez mais humana, cada vez mais fiel ao Espírito da caridade cristã.

O Centro Social paroquial é dirigido por exigência legal, civil e canónica, por um conjunto de pessoas que constituem os órgãos sociais dirigentes da Instituição e que são voluntários de entre os paroquianos que estejam dispostos a desenvolver os conhecimentos que têm, na perspectiva do exercício da Acção Social e da Solidariedade Cristã.

Mas não é só de voluntários dirigentes que o Centro Social Paroquial precisa. Muitas outras actividades eventuais ou mais ou menos regulares poderiam vir a beneficiar as pessoas que delas precisam, se mais Leigos voluntários dessem algumas horas dos seus tempos livres ao serviço destes irmãos. Para isso estamos agora a implementar, mais uma vez, o serviço de voluntários. E não esqueçamos que Frederico Ozanan, jovem universitário, começou por juntar lenha para os pobres se aquecerem e não passarem frio. O Pe. Américo acolheu e promoveu a pessoa humana. O Pe. Adolfo Kolping promoveu o trabalho comunitário. O Pe. Cardijn lutou por maior dignidade da classe operária. O Pe. Óscar Romero é assassinado por defender os direitos dos explorados. A Madre Teresa de Calcutá acolhe os moribundos abandonados. Monsenhor Airosa funda uma obra para “Regeneração” das raparigas da rua. O Pe. Abel Varzim cria uma obra de raparigas marginais. Mons. Moreira das Neves e Maria Luísa Ressano Garcia funda a obra do “Ardina “. Frei Bartolomeu dos Mártires dá tudo o que pode para salvar da peste de 1570 e da carestia de 1574. João de Deus (S.) dá a vida pelos doentes.

Muitas pessoas com capacidades excepcionais permanecerão afastadas de certas práticas de Solidariedade Cristã ao serviço da Paróquia e do Centro Social por des-conhecimento do que é o Centro e qual o objectivo.

Dizemos solidariedade cristã porque para paroquianos confessos esperamos que esta seja iluminada pela fé, seja uma questão de opção  cristã e não seja apenas por opção puramente humana.

É de salientar que o Centro Social Paroquial à medida que cresce no âmbito da sua acção e assume exigências de qualidade comprovada, tem de integrar na sua equipa profissionais com habilitações próprias e com características humanas e de formação cristã adequadas à missão que desempenham e ao cariz da Instituição que representam. Daí o nosso esforço na melhoria da qualidade das respostas sociais que damos.

A Paróquia atinge a sua dimensão de Igreja na medida em que vive conscientemente a missão de louvor, anúncio e serviço, em união com Cristo e com a sua Igreja, na Eucaristia.

Se há lugar para Vicentinos, Legião de Maria, Serviço de Doentes e muitos outros, há por certo também um lugar próprio para o serviço, de uma forma regular, contínua, estruturada e organizada segundo normas e indicativos técnicos comumente aceites pelos Serviços Oficiais e pela Doutrina Social da Igreja, aos mais pobres, vulneráveis e desprotegidos, pois são os predilectos do Senhor.

S. Paulo afirma: “O Reino de Deus não é uma questão de comida ou bebida, mas é justiça, paz e alegria no Espírito Santo” (Rom. 14,47).

O Centro Social Paroquial deve ser cada vez mais o SERVIÇO aos Pobres, serviço que a Paróquia, por missão, tem de cumprir.

 

 

 

 

Artur Coutinho

 

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