domingo, 19 de julho de 2015

Papa anima amigos do povo


Papa anima amigos do povo

O discurso do Papa Francisco, na passada quinta-feira, na Bolívia, no encerramento do II Encontro Mundial de Movimentos Populares, foi de grande coragem profética, exigindo mudanças reais no sistema global, que “impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza.” Denunciou-o porque “não o suportam os camponeses (...), os trabalhadores (...), as comunidades (...), os povos (...) e nem sequer o suporta a Terra.”

Em alternativa, o Papa Francisco pediu aos representantes dos movimentos populares uma “globalização da esperança, que nasce dos povos e cresce entre os pobres”, para “substituir esta globalização da exclusão e da indiferença.”

Fez uma denúncia à “economia que mata”: “Quando o capital se toma um ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez do dinheiro domina todo o sistema socioeconómico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade inter-humana, faz lutar povo contra povo e até, como vemos, põe em risco esta nossa casa comum.”

Preveniu os ativistas da alternativa a um capitalismo selvagem: “Sabemos, amargamente, que uma mudança de estruturas, que não seja acompanhada por uma conversão sincera das atitudes e do coração, acaba, a longo ou curto prazo, por burocratizar-se, corromper-se e sucumbir.”

Para alcançar a mudança desejável, apontou três tarefas aos movimentos populares: “Pôr a economia ao serviço dos povos” (“O destino universal dos bens não é um adorno retórico da doutrina social da Igreja. E uma realidade anterior à propriedade privada”); “unidade dos povos”, sobretudo na América Latina (“nenhum poder efetivamente constituído tem direito de privar os países pobres do pleno exercício da sua soberania e, quando o fazem, vemos novas formas de colonialismo que afetam seriamente as possibilidades de paz e justiça”); e “defesa da Mãe Terra” (remetendo para a sua recente encíclica sobre a ecologia).

Solidário com movimentos populares, o Papa Francisco concluiu: “Digamos juntos do fundo do coração: nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhum povo sem soberania, nenhuma pessoa sem dignidade, nenhuma criança sem infância, nenhum jovem sem possibilidades, nenhum idoso sem uma veneranda velhice. Continuai com a vossa luta e, por favor, cuidai bem da Mãe Terra.”

Os movimentos populares da América Latina e de outros continentes, inclusive a Europa, já se tinham encontrado em Roma, sob os auspícios do Papa Francisco, em 2014 (foi tema de uma crónica que assinei neste espaço da VP, em 29 de outubro). Na Bolívia, o discurso histórico do Papa, fundamentado na Doutrina Social da Igreja, foi a cereja em cima do bolo no ativismo social de quem luta pela soberania popular.


Rui Osório

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