sexta-feira, 7 de junho de 2013

Violências sobre os idosos

 
 





1.     Os profissionais e os militantes da área do direito, da assistência social e da saúde têm conhecimento de maus tratos, de agressões e de outras formas de vio­lência contra os idosos, que muitas vezes são vistas como formas de um agir “nor­mal” e “natural”, ficando as “dores” ocultas por entre as lágrimas dos usos, costumes e relações interpessoais.

Sendo esse problema sério é também quase desconhecido - ou que se tem preferido desconhecer. Oportuno e im­portante foi, portanto, um relatório recen­te da Associação Portuguesa de Apoio à Vitima (APAV) referido no Solidariedade de Maio. Aí se refere que mais de 11.300 idosos, a grande maioria mulheres, fo­ram vítimas de violência doméstica nos últimos 12 meses, um número que tem vindo a aumentar todos os anos. Os agressores são maioritariamente ho­mens (68%) e em 39% das situações de violência doméstica os agressores eram os próprios filhos.

Aquele relatório no meio de uma ou­tra manifestação de violência, não menos preocupante, e que vem ganhando palco, forma e dimensão: são responsáveis polí­ticos a considerá-los “peste grisalha” e é o próprio Estado a admitir espoliá-los de par­te das suas parcas reformas, tirando assim a vez a uma geração que perde voz e a condená-la a um “cisma grisalho”. Idosos que pugnaram com fundadas expectativas e a quem foram dadas garantias e que, em tempos que teimam em ser difíceis, são muitas vezes o último sustentáculo das respectivas famílias, nem sempre solidá­rias ou gratas.

A violência contra os mais velhos é preocupante e expressa-se nas formas como se organizam as relações entre os ricos e os pobres, entre gêneros, as raças e os grupos de idade nas várias esferas de poder político, institucional e familiar.
 
 

2.      Num sistema com inspiração ca­pitalista, temos o factor econômico a ditar regras, onde o humano que deveria ser, si­multaneamente, fim e sagrado em si mes­mo, passa a ser meio de uma economia desumanizada, transformando cada um de nós em produtos, portanto, descartáveis. Vai sendo favorecida a ideia de que quem não produz, quem não domina os avanços da tecnologia... logo é excluído e taxado de ignorante, inútil ou estorvo.

Incentivados por uma comunicação social que aquece o sistema econômico, fixando e impregnando o pensamento de todos nós, sugerindo a cada dia que a velhice não tem lugar existencial no mun­do, não é difícil iniciarmos um processo profundo de rejeição aos idosos, sem se­quer notarmos os equívocos praticados e por isso mesmo, nem sentimos ver­gonha, como se nós, praticantes de tais actos, nunca houvéramos de envelhecer. Desde o mundo corporativo, com seus cruéis processos selectivos, que ex­cluem os seniores, ao progressivo aban­dono ou carência na área da protecção social e demais serviços que deveriam estar disponíveis e em pleno funciona­mento, constatamos a inabilidade, tanto no universo privado quanto público, para acolher o idoso, e propiciar-lhe, não só infra-estruturas necessárias, mas tam­bém a valoração e a dignidade pertinente a cada vida.

Como resultado de todo um proces­so educacional omisso, que não trabalha na formação de uma consciência política, social, econômica e familiar para se viver com maior qualidade esta fase tão previs­ta na história dos humanos, é frequente a sua subalternização e insuficiente o auxílio nesta etapa avançada da vida. Tanto o pró­prio idoso, como os que estão à sua volta, sentem-se sem recursos nesta fase para enfrentar os desafios da vida com qualida­de e com esperança.

3.      A nossa sociedade deve saber en­carar as suas contradições, pois quanto maior o número de contradições menor a qualidade de tudo o que empreendemos. Como uma grande catalisadora, pensar em formas criativas de abrir canais re­ceptivos para que também o idoso contri­bua efectivamente com as gerações mais novas por meio de seu maior patrimônio: suas experiências e vivências adquiridas durante a sua caminhada existencial. O idoso, com a sua sabedoria adquirida seus muitos anos de vida, torna-se o trans missor dos valores da cultura tradicional herdada dos seus antepassados e a progressiva harmonia inter-geracional apenas com o contributo de todos é possível.

Preservar a autonomia, independi e dignidade do idoso, promover o conceito de comunidades e instituições amigas dos idosos, implica em sabermos usufruir beleza que é a vida, em todas as fase da sua natural evolução, com seus desafios; encantamentos, limitações e possibilidades. Qualidade de vida pode ser alcança a partir de todas as áreas acima relacionadas, mas, acima de tudo, implica na conservação e na partilha do prazer em todos os seus aspectos.

Uma família ou uma sociedade que não enaltece os idosos ou os abandona e maltrata não merece viver o seu presente que desvaloriza a ciência e a serenidade da experiência, ignora o seu próprio passado e não constrói o seu porvir...

                                                                                                                                           Padre Lino Maia, Presidente da Cnis, in Voz Portucalense

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