segunda-feira, 22 de julho de 2013

Acção sem contemplação? Inútil

Acção sem contemplação? Inútil

«Não tenho tempo». Esta é a resposta mais vezes ouvida diante de uma pro­posta que é suposto a Igreja fazer na sua acção pastoral. Diante da constata­ção mais vezes repetida, a da dicotomia entre a fé e a vida, ou a fé sem as obras, ou a da falta do testemunho cristão na vida quotidiana, ou do ir/não ir à missa ao domingo... todos respondem: «não tenho tempo». E, de facto, não faltam sinais de uma so­ciedade sôfrega e ávida de diversão, a quem escasseia o tempo para que crianças, jovens e adultos possam saborear a con­templação da Be­leza que os rodeia. Não sabemos o que fazer nos tempos «livres», quando os há. Têm de estar todos preenchidos. Vivemos correndo e como que fugindo de alguém (Alguém?), que nos quer agar­rar e de quem (Quem?) temos medo.

E porquê?

Porque temos medo de parar num tempo verdadeiramente livre com o objectivo único de me encontrar, de sentir a pró­pria vida, o pulsar do próprio coração?

A sociedade de hoje está, de facto, doen­te: desvia-se do essencial, da profundi­dade do ser e entra na via da fuga sem saber para onde se dirige. Impõe-se pa­rar. Parar para (se) contemplar. E o tem­po de férias pode ser a oportunidade a não perder. E sabemos como não faltam pessoas de vida excepcionalmente ocu­pada durante todo o ano que anseia por uns dias de férias passadas no silên­cio de um mosteiro, à mesa frugal dos monges, longe da agitação para onde a evolução tecnológica nos atitou.

Se olharmos ao próprio texto bíblico vemos que, no ritmo da criação num espaço de sete dias, Deus termina a sua obra com a contemplação: «E Deus viu que tudo estava bem feito!».

Impõe-se esta contemplação sob pena de nos desgraçarmos, de nos hipotecar­mos a nós mesmos, levando-nos a pas­sar pela vida sem a vivermos.

O evangelista Lucas conta-nos que, um dia, Jesus foi questionado por Marta, queixosa de sua irmã, que não a aju­dava nas lides domésticas, preferindo «sentar-se a ouvir o Mestre». Na Marta atarefada estamos todos nós, com ter­ríveis dificuldades em parar, em escutar a harmonia da criação ou o silêncio do coração. E na Maria, sua irmã, estamos nós quando, atentos à nossa própria interioridade, desejamos uma palavra diferente, a de Deus.

A prioridade da escuta da Palavra de Deus é uma opção inadiável na vida do crente de hoje. Sob pena de perder as razões da sua esperança e passar a viver como os que não têm fé. Sem o confronto permanente com a Palavra de Deus, o cristão fica, em pouco tempo, anémico, vazio, seco espiritualmente. Quem não o sente?

Prioridade das prioridades na Igreja de hoje é a escuta da palavra de Deus, pon­to de partida para qualquer acção ecle­sial. Logo, não pode haver acção sem contemplação. O activismo na Igreja é pecado facilmente identificável... nos outros, a quem julgamos. Mas de difícil reconhecimento em nós próprios.

A hospitalidade, tantas vezes apregoa­da com a necessidade de um compor­tamento acolhedor para com os outros, tem de o ser, antes de mais, do próprio Deus que, à semelhança do que acon­teceu com Abraão, tão bem retratado no ícone da Trindade de Rublev, nos vi­sita. Deus é o hóspede mais esquecido no nosso tempo. Conceder-lhe hospi­talidade é a maior necessidade. E se a Igreja não ousa propor e mesmo ousar novas formas de propor Deus à socieda­de, a cada um dos homens e mulheres que nos rodeiam, corre o risco de falhar no essencial da sua missão. E há hoje tantos cristãos tíbios e com medo de se assumirem crentes, sem coragem para testemunharem a fé ou falarem se m medo da sua fé no Senhor!
O Prior - P. Abílio Cardoso in boletim de Barcelos

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